Visões de mundo e concepções das pessoas no mundo do trabalho

Visões de mundo e concepções das pessoas no mundo do trabalho

As organizações estão inseridas em um contexto social, político, econômico e cultural e, portanto, sofrem alterações ao longo do tempo em função das mudanças que ocorrem no ambiente externo.
Você já deve ter imaginado que essas mudanças impactam a maneira como as pessoas são tratadas no ambiente de trabalho.
Os diferentes nomes atribuídos ao gerenciamento das pessoas no contexto organizacional revelam um pouco o impacto que as mudanças ocorridas no mundo exercem no ambiente de trabalho.
Você já deve ter ouvido falar em diferentes nomes para se referir ao gerenciamento das pessoas no trabalho, não é mesmo?
Eis alguns deles: administração de recursos humanos, gestão do capital intelectual, gestão de talentos humanos, gestão de pessoas ou até mesmo gestão com pessoas.
Quais as razões do uso desses diferentes nomes?
Essas diferentes denominações revelam concepções diversas sobre o homem no trabalho que, por sua vez, revelam diferentes visões de mundo.
Vejamos uma abordagem apresentada por Mato, Santamaría e Souza Silva (2001) que demonstra bem o que queremos destacar.
Esses autores assinalam três diferentes visões que caracterizam o mundo em que vivemos. Esse mundo, para eles, não é concebido como uma época de mudanças, mas como uma mudança de época.
Por que você acha que esses autores denominam o mundo atual de mudança de época? .
As visões de mundo analisadas por eles são: mecânica, econômica e holística. Essas visões determinam as formas como as organizações interpretam a realidade, a fim de compreendê-la e as ações que realizam para transformá-la.
Na visão mecânica, buscam-se soluções técnicas para todos os problemas organizacionais e as pessoas são vistas como recursos humanos. Essa visão perdura desde os séculos XVI e XVII, sendo consolidada no século XVIII. "O mundo é percebido como uma máquina sem sentimentos, onde a razão mecânica exclui a emoção humana".
Já na visão econômica do mundo, "a metáfora do mercado assume o comando da tarefa de moldar modelos mentais individuais e marcos institucionais que, por sua vez, influenciam a percepção, as decisões e as ações dos atores sociais das sociedades." (MATO; SANTAMARIA; SOUZA SILVA, 2001, p. 11). Os autores destacam que os gerentes passaram a ser considerados capital intelectual, os quais, do mesmo modo tratavam àqueles que gerenciavam. Somente era considerado importante "o que tem ou o que agrega algum valor econômico." Esses gerentes eram "capacitados de maneira exaustiva para, na maioria das ocasiões, buscar resposta para uma pergunta: Que valor agrega...?" . Eram gerentes competitivos que tinham como preocupação usar o seu capital intelectual para "criar vantagens competitivas para sua organização e da tecnologia da informação, que lhe permite prescindir do capital humano não necessário" (MATO; SANTAMARIA; SOUZA SILVA, 2001, p. 13).
Na visão holística de mundo, "a metáfora do sistema influencia a formação de modelos mentais individuais e marcos institucionais, cujas referências incluem uma preocupação por todas as formas de vida no planeta". Com base nesta visão, os gerentes são formados como cidadãos "que são talentos humanos, com imaginação, intuição, curiosidade e motivação, capazes de perceber e criar além de suas experiências e conhecimento prévios" (MATO; SANTAMARIA; SOUZA SILVA, 2001, p. 12-14). O princípio que norteia a ação dos gerentes com essa visão é o de aprender fazendo, na busca do desenvolvimento do seu talento para gerenciar outros talentos.
A análise da abordagem dos autores permite-nos concluir que uma das principais razões para o não uso da denominação Administração de Recursos Humanos nos dias atuais, é destacar que as pessoas não são recursos como os financeiros, materiais e outros que as organizações utilizam, mas ocupam um lugar privilegiado nestas. Assim, o homem deve ser considerado, em sua complexidade, como alguém que pensa, reflete, produz idéias novas e é capaz de provocar mudanças. Ele aprende, modifica o ambiente onde está inserido e a si próprio. Desse modo, você pode concluir que o homem sofre influência das modificações nas organizações, assim como ele modifica o ambiente onde trabalha a partir da sua atuação.
Você pode perceber que essa é uma visão holística ou sistêmica do mundo.

Mato, Santamaría e Souza Silva (2001, p.22-23) enumeram algumas das características da visão holística do mundo. São estas:
• o mundo é um sistema dinâmico e complexo, com múltiplas dimensões e funções interconectadas e é habitado por uma diversidade de entidades vivas inter-relacionadas, incluindo a espécie humana organizada em sociedades;
• a história é relevante para a compreensão, pois o passado, o presente e o futuro estão inevitavelmente conectados. Para construir um futuro diferente e melhor é preciso, a partir de hoje, pensar, atuar e aspirar diferentemente, com base em lições do passado, os compromissos negociados no presente e os cenários (futuros) alternativos;
• o contexto é o produto das diferentes percepções dos diversos grupos de atores sociais que compartilham distintas visões do mundo;
• a organização é um sistema aberto e dinâmico, que reflete as principais características e contradições dos sistemas mais amplos com os quais realiza trocas.

Como as pessoas no ambiente de trabalho são consideradas nessa visão de mundo? Qual a visão de mundo mais típica da idéia dos trabalhadores como colaboradores? O que se espera dos profissionais ao tratá-los como colaboradores?
Com base na visão mecânica de mundo, a preocupação que se tinha com relação ao trabalhador não era com o treinamento para o exercício das atividades diárias do trabalho, mas com o adestramento. O homem não era encarado com bons olhos, pois era visto como um irresponsável, vadio e negligente e, portanto, deveria ser acompanhado bem de perto para que produzisse muito.
Era fácil aprender a tarefa a realizar no trabalho, já que era tão repetitivo, monótono e chato.
Não é à toa que, com o tempo, as pessoas começaram a faltar muito ao trabalho (elevado absenteísmo); o rendimento caiu e muitas mudanças de local de trabalho ocorreram (aumento da rotatividade). As pessoas eram separadas naquelas que pensavam (supervisionavam os trabalhos) e nas que executavam.

Há bastante tempo se buscam explicações sobre quais as melhores maneiras de administrar pessoas no ambiente de trabalho. Em função do contexto econômico, político e social, esses modos de gerenciar caracterizaram-se de formas muito diferenciadas ao longo do tempo.
Fleury (2002) também analisa as mudanças sofridas pelas organizações em decorrência das transformações do ambiente externo, tais como o processo de globalização financeira, comercial e produtiva.
Dutra (2004), por sua vez, descreve as principais mudanças observadas em empresas brasileiras nos anos 90 e na primeira década dos anos 2000. São elas: alteração do perfil das pessoas exigido pelas empresas (deixa de ser o de alguém obediente e disciplinado para ser um profissional autônomo e empreendedor); deslocamento do foco da gestão de pessoas do controle para o desenvolvimento (ao invés de ser controlada, a pessoa deve ser gestora de seu desenvolvimento na organização); maior relevância das pessoas no sucesso do negócio ou da empresa (inteligência e criatividade como fator competitivo para a organização).
Para concluir, destacamos que a gestão de pessoas retrata uma concepção de mundo organizacional em que as pessoas pensam, refletem e geram novas idéias sobre o trabalho que realizam, e essa forma de ver as pessoas impacta no modo como devem ser gerenciadas. Cabe destacar que nem sempre os homens são tratados como pessoas, pois muitas vezes ainda vemos condutas típicas da visão mecânica: o profissional sendo vigiado e controlado no trabalho. Na realidade, as diferentes visões de mundo encontram-se presentes nos dias atuais e quando entram em conflito, muitas vezes, fazem surgir novas concepções.

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